terça-feira, 12 de maio de 2009

Noites Tropicais

Devorei, com nove anos de atraso, Noites Tropicais, de Nelson Motta (Objetiva, 2000). É uma espécie de autobiografia dele misturada com a da música brasileira, dos anos 60 ao final dos 90. Jornalista e letrista, Motta teve o privilégio de conviver com os artistas mais representativos da história recente do Brasil, desde a bossa nova (é amigo de longa data de João Gilberto) à Jovem Guarda (Erasmo, Roberto...), MPB (Caetano, Gil, Chico, Elis - de quem foi namorado -, Tim Maia, Raul...), discoteca, rock, passando pelo cinema novo (era muito amigo de Glauber Rocha) e artes plásticas (Hélio Oiticica).

Pelas páginas do livro surgem histórias dos bastidores dos festivais de música, gravações de discos e programas de tevê, sexo e drogas, o reflexo cotidiano das oscilações da política e da economia, altos e baixos de artistas que nos acostumamos a ouvir nas rádios esses anos todos. Nelson Motta foi observador participante de uma fase riquíssima da música brasileira, que influenciou fortemente a música americana e de outros países. Ele conta isso tudo de maneira simples e engraçada, como uma conversa informal.

Até hoje numa ouvi um audio-book, mas tenho certeza que este é o livro ideal (e já tem audiobook pra curtir a experiência sinestésica de acompanhar essas histórias ouvindo as músicas que ele cita. Noites Tropicais é uma viagem no tempo: muitas dessas músicas foram trilhas sonoras da minha infância, adolescência e início da vida de adulto. Alguns trechos que pesquei no site da Objetiva:

CHICO

"Algum tempo depois o amigo paulista de Edu apareceu, tímido e simpático, numa roda de violão na praia. Pediu o violão para mostrar umas coisinhas. Tocou algumas músicas e as meninas estavam adorando. Mas quando ele disse que teria uma música sua gravada pela Claudete Soares achei que era pura cascata (ou "bafo" como se dizia na época). Imaginem se a grande Claudete Soares iria gravar a marchinha de um inédito. E paulista! Ele cantou "Marcha de uma Manhã de Sol" e assim que terminou, pedi licença e tomei-lhe o violão - que era meu - e comecei meu showzinho.

Foi assim que conheci Chico Buarque."

ATRÁS DA PORTA

"Extravasando seus sentimentos, misturando as dores da separação com as esperanças de um novo amor, Elis cantou, mesmo sem a segunda parte da letra, com extraordinária emoção, com a voz tremendo e intensa musicalidade. Na técnica, quando ela terminou, estavam todos mudos. Elis chorava abraçada por César. Juntos, César e Menescal foram levar a fita para Chico, que ouviu, chorou, e terminou a letra ali mesmo, no ato."

PASSEATA

"Na passeata dos cem mil Chico e eu éramos do mesmo grupo, com Jards Macalé, Edu Lobo, Zé Rodrix, Mauricio Maestro e outros, e nosso ponto de encontro era na escadaria da Biblioteca Nacional, na Cinelândia. Chegamos quase juntos, olhando para os lados, disfarçando, dando bandeira. Como ainda faltava bastante tempo para a hora marcada para a passeata decidiu-se por unanimidade ir ao Bar Luiz, na Rua da Carioca, tomar um chope para aliviar a tensão. Voltamos a tempo ao ponto, mas mais tensos ainda: eu tinha medo de apanhar da polícia, de levar um tiro, de ser preso, e não ousava imaginar que íamos viver um dia de glória."

2 comentários:

Diz aí