segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Lido & Releno: Salim Miguel e Rubem Fonseca

Terminei Nur na escuridão, de Salim Miguel. O romance conta a trajetória de sua família, que saiu do Líbano em busca de vida melhor nos Estados Unidos e, pelas artimanhas do destino, veio parar no Brasil. Gostei muito e me identifiquei. Minha família, embora não tenha vindo do exterior, foi meio nômade durante boa parte de minha infância e adolescência. Mudanças de cidade e de casa, readaptações e choques culturais, com todo o difícil aprendizado que envolvem, fizeram parte da vida do escritor (e da minha). Sua obra está impregnada de carinho pelos personagens que habitam a memória desses tempos. A narrativa do patriarca libanês, pai dele, é fragmentada, com lacunas, elipses, contradições e reiterações como costumam ser as boas histórias orais que prendem os ouvintes. Recomendo! (peguei emprestado na biblioteca Barca dos Livros, na Lagoa da Conceição). Ah, Felipe Lenhart publicou na revista Cult de julho um ótimo perfil de Salim Miguel. O escritor "líbano-biguaçuense", como ele gosta dizer, recebeu há pouco da Academia Brasileira de Letras o Prêmio Machado de Assis pelo conjunto da obra.

Também peguei na Barca dos Livros a excelente compilação 64 contos de Rubem Fonseca. Já havia lido praticamente todos, mas foi com prazer que pude voltar a algumas joias, como Passeio Noturno - parte I, A força humana, Feliz ano novo, O balão fantasma e O cobrador ("Estão me devendo comida, boceta, cobertor, sapato, casa, automóvel, relógio, dentes, estão me devendo"). Uma vez eu disse aqui que, quando crescesse, queria escrever que nem o cronista Rubem Braga. Posso dizer o mesmo sobre o contista Fonseca (como romancista, acho que tem altos e baixos). É um doutor na arte das histórias curtas, com domínio absoluto da linguagem e do ritmo. Seus temas, fascinantes e às vezes inverossímeis como a própria realidade, abordam os escaninhos nebulosos e violentos da alma humana nas grandes cidades. Invoco os itens 2, 3 e 4 dos direitos inalienáveis do leitor pra não repassar todas 799 páginas deste livro. Tenho folheado aleatoriamente suas delícias.

Publicado também em DVeras em Rede